Tuesday, October 14, 2008

Crise de 1929, oito décadas depois

Na crise de 1929 as maiores quedas não ocorreram nas fatídicas quinta, segunda e terça feira negras. Após um pânico inicial e uma recuperação no final de quinta feira e durante a sexta feira, as acções caíram “apenas” mais um total de 25 % na segunda e terça feira negras . No entanto quem começou a comprar logo de seguida fez um mau negócio pois embora as acções tenham recuperado tansitóriamente, continuaram depois a cair até 1932 . O Dow caiu de 381 em 3 de Setembro de 1929 para cerca de 40 em 1932. Ou seja ficou quase 1/10 daquilo que era. Imaginem o fácil que era perder dinheiro naquela altura.

A maneira como se está a lidar com a crise actual é provavelmente mais adequada à resolução da mesma, mas os sentimentos humanos (medo e ganância) são os mesmos. Uma diferença que se pode observar é que a descida foi mais lenta (mas aconteceu na mesma) e que a subida está a ser mais rápida. Diria que o mercado se estava a recusar a acreditar que ia haver uma crise (mas que quando acreditou a bolsa caiu na mesma) e que agora está a acreditar muito depressa que os remédios vão funcionar.

Mas a grande questão é se vai haver uma segunda queda e novos mínimos ou não?


A queda actual foi devida às financeiras. Será que se vai assistir a uma recuperação transitória e a uma segunda queda derivada do contágio à economia real?

Ou será que o mercado já está a descontar os efeitos na economia real?

Pelo comportamento do mercado no último ano parece-me bem que o mercado não está a descontar os efeitos na economia real. O colapso das financeiras foi antecipado por muita gente, mas só um ano depois é que aconteceu efectivamente. Parece que o smart money não é assim tão smart e estava à espera do tal milagre que nunca aconteceu. Será que as mesmas pessoas estão agora à espera que a crise financeira não contagie o resto da economia? Se for assim vão às compras e só quando virem os lucros das empresas não financeiras a descer acentuadamente é que vendem novamente, mas nessa altura já não deve haver muitos compradores.

Isso implica que as subidas actuais irão dar origem a descidas, provavelmente antes dos 5 meses que tal demorou em 2009.

Tuesday, September 30, 2008

A crise actual e os efeitos na bolsa a médio prazo .




Na minha opinião, a consequência mais dramática da crise financeira actual, será a dificuldade que as empresas vão sentir em obter novos financiamentos ou até mesmo em manter os actuais, o que terá um efeito de dominó sobre a economia..
Todas as empresas funcionam com base nos seus capitais próprios, os quais são alavancados recorrendo a capitais alheios, nomeadamente empréstimos bancários. Nos últimos anos as facilidades de financiamento aumentaram muito e foram os próprios bancos a pressionar as empresas para que se endividassem mais, abrindo com toda a facilidade novas linhas de crédito. Não é difícil imaginar que devido à facilidade de crédito, deve ter havido empresas que decidiram por exemplo, expandir a actividade para novos produtos (rentáveis) usando uma linha de crédito para financiar o inventário que tiveram de colocar em armazém e para contratar novos vendedores. Em condições normais como a linha de produtos é rentável, a empresa vai conseguindo cash para pagar os juros e pagar aos empregados e vai renovando a linha de crédito. Ao fim de alguns anos está tudo pago. Mas... se o banco fechar a torneira de repente, a empresa fica sem dinheiro para pagar aos credores apesar de ser rentável e tudo se desmorona, mesmo o negócio antigo.


Mesmo imaginando que a torneira não é completamente fechada, é fácil perceber que nas condições actuais, o crédito terá um custo maior. Muitas empresas não vão conseguir renovar os empréstimos em condições favoráveis. Essas empresas vão começar a sofrer pressão para reduzir as dívidas (e a actividade) e vão forçosamente ter menores lucros.

Qual o efeito disto sobre a bolsa?
Mesmo admitindo que o pânico não se instala, a diminuição dos lucros será sempre um problema. Para complicar ainda mais, ninguém sabe ao certo quantificar essa diminuição. O resultado é que se torna quase impossível avaliar as empresas. Por isso, as decisões de compra vão sendo adiadas e a margem de segurança exigida pelos investidores para comprar acções será maior. As pessoas poderão só estar dispostas a comprar acções se estas estiveram estupidamente baratas como aconteceu na grande recessão. Por isso dizer neste momento que uma acção está barata porque tem um PER de 10 não faz nenhum sentido. O que faz sentido é pensar qual será o PER dela daqui a 4 anos nos vários cenários possíveis, mas isso é compreensivelmente dificil.

Tuesday, September 23, 2008


Quem já leu as cartas de Warren Buffet aos accionistas da Berkshire deve-se lembrar da carta de 2002. Na altura ele estava a tentar-se livrar dos derivados que estavam no balanço da General Re (tinha tomado posse desta seguradora há relativamente pouco tempo e percebeu o perigo que era ter os derivados no balanço). Fez portanto o que devia fazer vendeu-os com prejuízo enquanto podia e encerrou o negócio dos derivados. O mais curioso é que em vez de ficar calado, publicitou a venda e explicou detalhadamente o problema, só que todos fingiram não ouvir o que ele dizia. Nesta altura deverá haver muita gente a pensar eu lhe deveria ter prestado mais atenção. Não foi por acaso que se tornou um dos homens mais ricos do mundo

“When we purchased Gen Re, it came with General Re Securities, a derivatives dealer that Charlie and I didn’t want, judging it to be dangerous. We failed in our attempts to sell the operation, however, and are now terminating it.”

Aconselho vivamente a ler toda a carta original. Ficam aqui apenas mais dois extractos para o post não ficar muito pesado:


“Charlie and I believe, however, that the macro picture is dangerous and getting more so. Large amounts of risk, particularly credit risk, have become concentrated in the hands of relatively few derivatives dealers, who in addition trade extensively with one other. The troubles of one could quickly infect the others.
On top of that, these dealers are owed huge amounts by non-dealer counterparties. Some of these counterparties, as I’ve mentioned, are linked in ways that could cause them to contemporaneously run into a problem because of a single event (such as the implosion of the telecom industry or the precipitous decline in the value of merchant power projects). Linkage, when it suddenly surfaces, can trigger serious systemic problems.”

"We try to be alert to any sort of mega-catastrophe risk, and that posture may make us unduly appreciative about the burgeoning quantities of long-term derivatives contracts and the massive amount of uncollateralized receivables that are growing alongside. In our view, however, derivatives are financial weapons of mass destruction, carrying dangers that, while now latent, are potentially lethal."

http://www.berkshirehathaway.com/letters/2002pdf.pdf

Monday, September 22, 2008

inflacção e lixo tóxico



O gráfico acima mostra bem o que foram os excessos dos últimos anos: O sistema financeiro americano (e não só) andou a ter “lucros” que só existiam para pagar bónus aos gestores e agora chegou a altura de pagar a conta e os primeiros a fazê-lo serão os americanos pois parece que o Tio Sam de pois de salvar os primos Fannie Mae e Freddie Mac, e o gigante AIG, tirou da cartola o grande plano: comprar todo o lixo tóxico dos bancos. Mas depois de tanto salvamento é a altura de perguntar: quem irá salvar o Uncle Sam?


A pergunta é simples: há muita gente a desconfiar que todos estes salvamentos vão ser feitos imprimindo mais dinheiro - a receita clássica dos governos em dificuldades - mas há um perigo bem real e conhecido de imprimir demasiado dinheiro: a inflação. A queda do dólar que se seguiu ao anúncio do plano parece anunciar mesmo isso.


À medida que o mundo for tendo a noção dos problemas, estará muito menos disposto a aceitar dólares. Os americanos estão muito confiantes pois não há grande alternativa ao dólar, mas ela poderá acabar por surgir em caso de necessidade..


É claro que a nacionalização da Fannie Mae e do Freedie Mac foram feitas para sossegar os investidores internacionais de que os seus empréstimos estavam seguros e que iriam ser pagos pelo contribuinte americano, mas demonstrou claramente que a situação é muito delicada e faz-nos pensar no que poderá acontecer se de repente as pessoas começarem a pensar duas vezes antes de emprestar dinheiro aos Estados Unidos. A resposta evidente é um aumento da inflação e das taxas de juro exigidas. Toda a América vive de dinheiro emprestado pelo resto do mundo e fechar de repente a torneira do crédito barato iria causar um ajustamento brutal.

Esta era uma daquelas coisas em que ficaria imensamente feliz se estivesse enganado. Oxalá esteja.


origem da imagem: C. Hugh Smith http:// oftwominds.com/blogsept08/crash9-08.html

Saturday, March 1, 2008

O que vai acontecer aos Equity Funds?

Até agora a crise do subprime tem sido mais ou menos contida. Fora o sector financeiro que ficou com os prejuízos, e as imobiliárias e as construtoras que viram os seus negócios baixar significativamente não houve verdadeiras vítimas e mesmo os bancos estão a conseguir manter a cabeça à tona da água devido à ajuda dos governos. A pergunta que se põe agora é: Será que a coisa está contida ou a crise vai alastrar?

Muito do crescimento da bolsa dos últimos anos foi devido à acção dos Equitiy é pois importante em altura de crise olhar para estes fundos pois a descida do mercado pode ser amplificada por problemas neste sector.

Os Equity pelo facto de terem menos necessidade de comunicar com o mercado conseguem manter as más notícias escondidas durante mais tempo, mas não as conseguem esconder para sempre. A minha opinião é que as más noticias vão acabar por vir à tona e isso vai despoletar uma nova fase na crise. Os $200bn de divida das LBO que os bancos ainda não conseguiram vender mostra bem que nos próximos tempos não vão conseguir emprestar dinheiro para este sector e neste momento os retornos não são suficientemente atractivos para que o dinheiro que necessitam venha de outro lado (leia-se Sovereign Funds) a custo razoável.

É evidente para todos que a crise nos mercados de dívida complicou muito a vida aos Equity. Não só os impediu de seguir a sua estratégia tradicional de comprar empresas usando uma pequena porção de equity e um monte de dívida como também lhes dificulta a renovação da divida contraída, as força a pagar mais pela divida que conseguiram renovar e as impede de vender com lucro as empresas que têm em carteira. É evidente que alguns vão ser forçados a curto prazo a vender com prejuízo e não se podem dar ao luxo de esperar muito mais. Os investidores já estão a sentir na pele que os cheques dos fundos têm tardado a chegar e nos próximos tempos deverão começar a receber os relatórios do ano passado onde os gestores os vão começar a preparar para os tempos negros que se avizinham. Aliás basta ler o tom da carta da Cerebrus aos investidores do passado dia 22 de Janeiro para adivinhar o que vem aí.
O verdadeiro problema vai acontecer se estes fundos forem fundos forem forçados a vender ao desbarato as empresas que têm em carteira, ainda por cima num cenário de recessão. Isso poderá provocar uma descida acentuada dos múltiplos a que se transaccionam as empresas e arrastar ainda o sector da Comercial Property que se têm mantido relativamente a salvo. O efeito na bolsa nesse caso não se fará esperar: uma descida acentuada.

Por todas essas razões a minha conclusão é que apesar de todas as descidas a bolsa ainda não está barata e que mais vale perder um ou dois negócios tentadores até que se perceba bem o verdadeiro estado do mercado.

Só para aperitivo amargo aqui fica uma lista de 7 vitimas de private equity buyouts retirada do WSJ que pediram protecção de falência no ultimo mês. Significativamente apenas uma delas (PRC) foi comprada entre 2006 e 2007 aos múltiplos estupidamente caros usados na altura mas deverá apenas ser uma questão de tempo para que a lista engrosse significativamente.

Meet Seven Private-Equity Buyout Victims
Sirva Inc., a moving company bought by Clayton Dubilier & Rice Inc. in 1999 by combining two companies CD&R owned, in a deal worth $450 million;
Wickes Furniture, furniture retailer bought by Sun Capital Partners and furniture vendor Rooms to Go in 2002 for an undisclosed price. Sun Capital bought out the interest of Rooms to Go in 2004 for an unknown sum;
Blue Water Automotive Systems, car parts provider bought by KPS Capital in 2005 for an undisclosed price;• PRC Inc., a call-center operator bought by Diamond Castle Holdings in 2006 for $286.5 million;
Buffets Holdings, a restaurant operator bought by CI Capital in 2000, for $643 million;
Heartland Industries, lubricant distributor bought by Quad-C Management in 2002 for an undisclosed price and a total equity investment of $39 million;
Propex Inc., a maker of carpet backing bought by Sterling Group, Laminar Direct Capital and Genstar Capital in 2004 for $340 million
http://blogs.wsj.com/deals/2008/02/15/meet-seven-private-equity-buyout-victims/

Sunday, January 13, 2008

Nesta crise só perde dinheiro quem quer: os avisos foram mais que muitos.

Desde Julho-Agosto até agora a minha estratégia tem sido: “Vender calmamente e ficar quietinho a ver o que acontece”.

É simples e até agora tem resultado em pleno. Não quer dizer que seja fácil manter a disciplina e não comprar quando uma acção de uma boa empresa aparece a preços de saldo, mas se estamos convencidos que o mercado ainda vai descer mais, não vale a pena comprar, até porque, tal como nas subidas, o mercado é também irracional nas descidas. Num crash descem as acções caras e também as baratas. É claro que quem gosta de arriscar pode fazer trades contra o mercado e tirar partido das descidas, mas uma coisa é ter a convicção de que o mercado vai descer, outra muito mais difícil é saber em que dia isso vai acontecer, daí a minha estratégia de ficar quieto à espera.

Quase seis meses depois do despoletar da crise o que é certo é que pouca coisa se alterou, excepto talvez a confirmação de que os grandes bancos de investimento estavam hiper-expostos ao subprime, o que os levou a terem de fazer reservas significativas com relfexos directos na sua capacidade de concessão de crédito. Os “private equity” e os “hedge funds” por enquanto têm-se conseguido manter à tona. A minha opinião é que não foram só os bancos de investimento a fazer asneiras, simplesmente estão mais sujeitos à regulação e não conseguiram esconder a situação por muito tempo, Talvez seja essa a explicação para o facto das descidas terem sido mais suaves do que seria de prever, mas a verdade é como o azeite e se os danos começarem a aparecer fora dos bancos de investimento poderemos assistir a um acentuar do declive das descidas.


A crise do subprime não é o o problema, é só a ponta do iceberg. O verdadeiro problema é que grande parte do crescimento dos últimos anos foi baseado em crédito fácil. Parecia que alguém estava a imprimir dinheiro a a entregá-lo de bandeja a quem o solicitava. E não foram só os particulares que compraram carros novos a crédito, foram também as empresas a comprar outras empresas a crédito. Agora que a máquina de imprimir dinheiro está avariada, o refinanciamento das dividas vai ser muito mais difícil. Muito provavelmente muitas das empresas compradas não geram fundos suficientes para pagar o financiamento nas novas condições, o que quer dizer que alguém vai ter prejuízo com o negócio.

Por outro lado, e olhado para a empresas não financeiras fora do sector imobiliário, o aperto do lado do crédito ainda não as afectou verdadeiramente, mas tal deverá acontecer a médio prazo. O maior custo do dinheiro aliado ao facto dos consumidores se sentirem mais pobres, vai forçosamente afectar os resultados. Não me admiraria muito se assistisse a uma redução para ¼ dos lucros de muitas empresas. Deste modo um PER de 10 agora parece barato pode passar a um Per de 40 que já não é assim tão atractivo.

Assim e olhando para a bolsa, a verdade é que a probabilidade de descida é neste momento muito maior do que a probabilidade de subida, por isso e por muito que custe, o melhor é manter a disciplina e continuar de fora, até se perceber melhor a verdadeira extensão da crise. Entretanto que tal aproveitar as férias forçadas e fazer uma visita ao CCB para ver a colecção de Berardo?